Localizado no coração de Campinas, o bairro Botafogo vive uma fase de reconstrução. Acostumado com a pujança em seus tempos áureos, abrigando locais renomados da cidade, como a antiga rodoviária e a fábrica de Chapéus Vicente Cury — que produziu o figurino para o clássico “Indiana Jones” —, o bairro viu sua relevância ruir. O cenário mudou com o tempo, principalmente após a chegada do Hospital e Maternidade São Luiz, que impulsionou esse novo momento.
O Botafogo nasceu no fim do século XIX, em meio a terrenos de brejos e lagoas. Diferente de vizinhos, como Bonfim e Guanabara, teve início marcado por dificuldades de urbanização, mas logo entrou no ciclo de loteamentos que acompanhou o crescimento acelerado da cidade.
Ao longo das décadas, a região ganhou importância com a chegada do transporte urbano. A linha de bonde nº 9, conhecida como “Botafogo”, era usada por estudantes rumo às escolas do bairro. Mais tarde, entre 1973 e 2008, a rodoviária Dr. Barbosa de Barros se tornaria um dos principais marcos locais, até a sua desativação.
A rodoviária foi implodida em 2010. Milhares de pessoas acompanharam a demolição, cercada por medidas de segurança e transmitida ao vivo pela imprensa local. O estrondo da implosão e a nuvem de poeira que tomou conta das ruas vizinhas marcaram simbolicamente o fim de uma era, deixando em muitos moradores um sentimento de perda e de incerteza sobre o futuro do espaço.
“Depois da rodoviária, teve um impacto de diminuição (de movimento) em 90%. Os comércios da região ficaram praticamente abandonados, a região ficou abandonada ao redor da antiga rodoviária”, comentou Paulo Peixoto, comerciante local.
Com a desativação da rodoviária, o bairro passou por um processo de degradação, mas a inauguração do Hospital e Maternidade São Luiz, em 2023, reposicionou o Botafogo no mapa da cidade. O hospital é considerado um centro de referência em saúde de alta complexidade, e a chegada do empreendimento não só devolveu movimento ao bairro, mas também trouxe novos negócios e impulsionou a valorização imobiliária ao redor.
“A estruturação do bairro vem se modificando, acompanhando a chegada do hospital. Várias construções que estavam abandonadas, hoje estão em reforma. Hotéis e prédios abandonados sendo reformados, estacionamentos ativos, comércios em volta, todos se estruturando. O bairro ganhou uma revitalização.” comentou Marcos Silva, diretor médico do Hospital e Maternidade São Luiz.
O Botafogo reúne também instituições históricas e médicas de peso. O IAC (Instituto Agronômico), criado em 1887, é referência internacional em pesquisa agrícola. O Hospital Vera Cruz, fundado em 1943, e o Penido Burnier, especializado em oftalmologia desde 1920, são polos de saúde que movimentam a região.
Lar de gênios
O Botafogo abriga o Colégio Culto à Ciência, a escola mais antiga do Brasil em funcionamento no mesmo local. Grandes personalidades passaram pelo colégio, como Alberto Santos Dumont, pai da aviação, Júlio de Mesquita, fundador do jornal O Estado de São Paulo, a atriz Regina Duarte e o apresentador Fausto Silva, o Faustão, que marcou época na televisão brasileira.
“No século XIX, foi um colégio, como o próprio nome diz, que valorizava a ciência, se opondo a um ensino ainda muito calcado em aspectos religiosos ou familiares” comentou Bruna Tella Guerra, coordenadora de gestão pedagógica geral do Culto à Ciência.
Se engana quem pensa que a tradição do Culto à Ciência representa o conservadorismo. A escola busca valorizar a diversidade, desenvolvendo os seus estudantes de forma integral.
A presença do Culto à Ciência impacta positivamente no Botafogo. Desde a promoção de eventos abertos, como a Festa Junina e a Feira de Ciências, até projetos que beneficiam a estrutura do bairro. Em caso recente, alunas do colégio promoveram o plantio de árvores, visando o conforto térmico com o passar dos anos.
Do Botafogo para Hollywood
O Botafogo também era sede da fábrica de Chapéus Vicente Cury. Parte do desenvolvimento de Campinas na primeira metade do Século XX, a planta chegou a produzir, no auge, 4,5 mil unidades por dia.
Na década de 80, a fábrica ganhou notoriedade graças ao cinema. Para o primeiro filme da saga Indiana Jones, a Chapéus Vicente Cury foi responsável por produzir a peça para o personagem de Harrison Ford, que tinha o chapéu como marca registrada.

“Chamou muita atenção quando foi dito que o Indiana Jones usava Chapéus Cury, ajudou ainda mais a propaganda, que já era famosa”, relembrou Maria Eugênia Cury, sobrinha de Miguel Vicente Cury.
Com o passar do tempo, a fábrica foi desativada e demolida. O espaço será destinado à um condomínio que mistura atividades residenciais e comerciais. Da antiga fábrica, restaram apenas parte da sua fachada e chaminé, tombadas pela Prefeitura, como lembrança dos tempos áureos.
Atualmente
No último censo, realizado em 2022, o Botafogo tinha uma população estimada em 6.121 habitantes.
Nem todos os residentes do Botafogo concordam que a chegada do Hospital e Maternidade São Luiz beneficiou o bairro. Para o porteiro João Neri, as atividades comerciais foram afetadas pelo empreendimento.
“Com a vinda do hospital, fecharam mais comércios. As pessoas esperavam que o fluxo aumentasse. Mas, como o hospital tem de tudo internamente, piorou”, ressaltou João.

Outra questão apontada pelos moradores é a segurança pública. Depois da implosão da rodoviária, o bairro ficou com “fama” de perigoso.
Comerciante local, Joel Corte mudou-se para o Botafogo no período entre a saída da rodoviária e a construção do hospital. De acordo com ele, era um lugar “que ninguém queria morar”.
Porém, Joel aponta para uma melhora na segurança do Botafogo. A revitalização realizada impactou em mais movimento no seu comércio, com pessoas procurando imóveis para morar. Mesmo assim, ele não deixou de pedir mais policiamento no bairro.

Hoje, o Botafogo é um bairro em transição. Mantém patrimônios históricos e educacionais reconhecidos, mas enfrenta o desafio de revitalizar espaços degradados e garantir segurança. Entre tradição e mudança, o bairro segue como peça fundamental para entender a história e o futuro de Campinas.
Vozes da Nossa Gente Campinas
O projeto multimídia “Vozes da Nossa Gente Campinas” é um projeto multimídia de conteúdo, desenvolvido pela redação do acidade on e pela Faculdade de Jornalismo e curso de Mídias Digitais da PUC-Campinas. A parceria de jornalismo hiperlocal contará a história de dez bairros da metrópole em reportagens, imagens e vídeos.
Esta matéria foi feita pelos alunos da Faculdade de Jornalismo da PUC-Campinas: Elizabeth Moreira Lins, Luísa Domingos Viana, Bianca Campos Bernardes, Marcelo Chiconato Pinelli, Ana Luiza Frozino Gomes e Victor Donizette da Costa, para o componente de Projeto Integrador VIII, sob supervisão da professora Amanda Artioli e edição de Leandro Las Casas.
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Bairro do Botafogo, em Campinas, abriga instituições centenárias, mas enfrenta o desafio da revitalização urbana
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